A ditadura vive


Publicado originalmente em Cão Uivador

O inquérito da Polícia Civil do Rio de Janeiro sobre o desaparecimento de Amarildo Dias de Souza, em 14 de julho, foi concluído. O documento, além de indiciar dez policiais militares, também aponta que Amarildo foi submetido a choques elétricos e asfixiado com um saco plástico. Epilético, ele não resistiu à tortura.

Você não leu errado. É isso mesmo: tortura. “Igual à ditadura?”, muitos perguntarão. Resposta: como é feito em uma ditadura que ainda não acabou.

Em 1985, simplesmente os militares deixaram o governo, cedendo-o aos civis. Mas a polícia segue sendo a mesma de antes, e não mudou seus métodos. Contra os pobres, como simboliza a morte de Amarildo. E também contra estudantes e professores, como se viu essa semana no Rio. No Brasil, a questão social continua a ser “caso de polícia”, e a ser tratada da maneira mais truculenta possível.

Quando o filme “Tropa de Elite” foi lançado, a classe média vibrou. Comemorava feito gol cada “vagabundo” morto, e quase tinha orgasmos quando o Capitão Nascimento dizia “traz o saco”. Um saco plástico semelhante ao que matou Amarildo e inúmeras outras pessoas.

“No BOPE não tem corrupto”, dizia o Capitão Nascimento no primeiro “Tropa de Elite”. Os bobos acreditaram. E mesmo depois da continuação do filme ser lançada e mostrar os interesses por trás de uma polícia absurdamente violenta, para muitos ainda “não caiu a ficha”. O mesmo Nascimento (que de capitão ascendera a coronel), ídolo de uma multidão sedenta de sangue, disse tudo: “eu não puxei esse gatilho sozinho”.

A ditadura, amigos, segue viva. E forte. Ela vive na criminalização dos movimentos sociais, no aplauso a ações truculentas da polícia, na vibração por “mais um vagabundo morto”, nas sessões de tortura que mataram Amarildo e muitos outros, em certos deputados que estão por aí pregando ódio… E, reparem, que parlamentares não “chegam lá” sozinhos: recebem votos para isso. Sinal de que representam o pensamento de muitas pessoas.

Ou seja, a ditadura vive em nós também. E nós podemos ser suas próximas vítimas.

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